quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Fênix Ressentida

Removendo a terra,
assentada sobre o meu caixão,
pude voltar a ver o mundo
que assassinou-me a paixão.

Que, como lâmina afiada,
incidiu profundamente em minh'alma.
Fez escorrer de meus olhos,
o sangue que me alimentava.
E apagou no espírito,
a chama que me amparava.

Definhei lentamente
enquanto perdia a visão.
E tudo na minha condição
era digno de repulsa.
Um homem sem perdão,
sem vontade, sem astúcia.
Escravo de condição
e mandarim por argúcia.

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Renasço hoje, nova vida,
uma nova roupa, nova figura.
Feita de pedra, estéril e fria
que vai vingar minhas amarguras.

Viver a vida conforme a teia
de ignóbeis teatralidades.
Viver a vida que aniquila,
em tudo e todos, a humanidade.

Queda

(Para Augusto dos Anjos)

Beijei o chão,
aos pés do morro.
virei de frente,
pedi socorro.
não veio ninguém,
pra ver a dor,
quando gritei.

Não foi por medo!
nem por preguiça.
não veio ninguém,
por egoísmo.
achar que a dor,
não fez sentido;
e que a minha queda,
foi construída,
ornamentada
na despedida,
de um melodrama
e não da vida.

Morri ali,
em meio ao lixo.
Prestando honras,
as tuas quimeras.
Que não se apiedam
do que está apartado,
mas ignoram
o que os espera.
(A solidão, esta pantera...)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Manhã de Segunda

Para Elsa Plascak.

Cai a noite de domingo e adormeço, com um sabor amargo da próxima manhã. Implacável, irresoluta nas suas imposições, que se colocam, estrondosamente, frente à débil luta que empreendo pra não deixar-me levantar. Para conseguir permanecer deitado e fluído, sentindo apenas a proximidade do teu corpo amado; da tua alma, que, nua, transparece, em sua brancura letárgica, ao meu lado.

Quando, ao despertar infernal dos relógios, que serão culpados por toda uma manhã, custosa e mal-humorada - positivamente improdutiva, e completa no desamor por todas as criaturas (não todas, quase todas!) - a primeira coisa que vejo, quando giro o corpo num gesto irrequieto, pelo transtorno do despertório recém adiado para dez minutos mais tarde, é o teu corpo com uma respiração vacilante que indica a certeza de um sonho, e o teu rosto levemente descontraído por um sorriso inconsciente, o mais doce de todos os sorrisos possíveis em mundos impossíveis. Então, tenho a certeza mortificante de estar fazendo a coisa errada. Ao contrário do que pensa a turba, a única coisa a se fazer nesse momento seria deitar fora os relógios e jogar-me novamente ao teu lado, para então fechar novamente os olhos lassos e partilhar dos teus descaminhos oníricos. Enquanto os corpos semi-nus voltam a se encontrar, forçando estradas, nos lençóis.

Porém, há a dolorosa obrigação de erguer-me. Ela me detém. Mortificando duas gerações de bons pensamentos e me levando ao mau-estar do dia-a-dia em sociedade.

Faço o café com pressa, só pensando em tomá-lo rápido, pra ter dois minutos mais a te admirar. E e quando pronto, acendo um cigarro, onde a fumaça me lembra, tranquilamente, as curvas do teu corpo. Enquanto as imagens vão me dizendo o quanto é desperdício sair de casa, de forma tão prematura, sem ao menos poder ver o teu despertar e voltar a ver o teu sono e admirar-te por mais cem mil manhãs, tardes e noites. Até o ocaso dos nossos dias. Volto então, para me despedir. Com lágrimas incontidas saio de casa. E recomeço mais uma semana da minha vida!

terça-feira, 22 de novembro de 2011

A besta

A besta,
docemente,
se aproxima
do alimento.
E vislumbra,
sorridente,
o que há
de por pra dentro.

Mas,
num frêmito de loucura
a vítima lhe pede,
que poupe sua carne,
que a besta se apiede.

A besta
por instantes
pondera tal pedido,
e vê que sua fome
faz muito mais sentido.

E garante à comida
que não haverá dor,
pois tudo que devora
ela devora com amor.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Cigarros

Acabaram-se os meus cigarros.

Entristeço-me, ao jogar fora, anos de investimento.
Como é que pode se acabar o meu último maço?
Todos os outros que traguei,
em razão deste último,

Vazio.

Com todas as marcas de batom que ficaram estampadas
nos filtros, por onde não passavam nada além de sonhos,
Na fumaça que formava imagens
de um sublime e radiante futuro,

apagado.

Meu cinzeiro improvisado numa caixa de aparelho dentário,
minha mania de bater o cigarro pra prensar o fumo,
minha vontade de um café bem forte
minha ânsia por encontrar,

um prazer.

Fumei os meus cigarros em devaneio,
andei a perder-me entre as brasas
e bailei entre as névoas do meu cachimbo
mas não fiquei satisfeito

ainda tem combustível
no meu isqueiro.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

(Soneto) do Passado

O tempo do que já se foi,
nos lembra do que não será.
Amigos compartilhando dor,
na vivência do desamar.

Reencontrar-se numa paixão,
no telhado a iluminar,
os tetos mofados da razão,
do ser-aí pra não restar

Nada. No pendor o coração,
volitivamente, a se quebrar
nas veredas pedregosas,

em perseguição aos amores.
No pretérito imperfeito,
um futuro que não há.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Guaicurus

Uma ratazana
devora os sonhos
avançando
sobre os corpos
deitados nas camas
da vileza,
como natimortos.

Mulheres sem nome
se deitam nas
ratoeiras
onde o desdouro
as consome.

Delirando
um futuro
que já foi traçado,
que, como todos os pecados,
repete-se num passado.

A sujeira, tão amada
há de assentar-se
sob nossos tetos
insalubres,
onde vendemos
nossas filhas,
onde crescemos
em família.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Valium

I

Senhor, faça me a gentileza:
Me dê na veia,
onde há sangue,
nesse corpo ávido,
um lenitivo
para a tormenta,
que se aprofunda
no espírito.

E caso não seja possível,
pode ser Valium,
pra matar de vez a sede,
me tornar estéril
e cavar em mim,
a sepultura,
pra enterrar o que sou.

II

Fui um indivíduo inventivo,
quis ser homem de convicções,
mas, foi mesmo no abismo,
que dei os passos altivos.

Compartilhei os nossos vícios
execrei as virtudes mais sublimes
não pensei nas atitudes
por trás de todos os meus crimes.

A poesia me impediu
de ter escrúpulos na vida.
pois tudo doía de forma vil,
quis matar minha essência.

Hoje, o valium, me resignou
sou um homem gentil
apascentei as minhas sendas
já não há porque seguí-las.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Estou farto! eu me calo.
pois sempre, quando falo,
tudo me parece enfado.
Agastado, Importunado,
Aborrecido, Irritado.
Sinonímias da condição,
constintuinte, de quem morre
morosamente, sem lenitivos.

Tomando o soma das aparências,
sofrendo todas as violências.
Com rebeldia, impraticada,
rastejamos pelas calçadas.

Dessa Sodoma, reinventada,
Dessa Gomorra, tecnológica.
Só sobrarão os covardes,
que, como eu, já não estão.

As memórias da desordem
as vivências da revolta
os desejos dos famintos
vão ser o obituário,
desse mundo, que se chama:
Prisão.
Construímos o presente
na opressão,
no descaso,
no frenesi.

Escrevemos nosso nome
com o sangue
que se coagula
na ferida,
que não cura.

Mas, daqui pra frente

Comeremos o ventre,
das madonas,
como abutres
religiosos.

Ganiremos ao luar
como lobos,
insaciáveis,
desvairados.

E então:

Destronaremos
as tradições
as maldições
que nos tornam
incapazes de ver
que só tem sentido
viver a luta
que vai de frente,
de braços dados,
pelas ruas.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Fuga

Só fugi duas vezes na minha vida
Uma quando nasci
E outra quando vivi
E tive que viver
Mesmo assim
Baloiçando
De um extremo ao outro
Com medo da queda
E da subida
Não entrando
Pra não ver saída
Desconhecendo
A despedida
Das relações
Não cometidas.
Cheguei longe
Pra não estar perto
Mas, de surpresa
Fui descoberto
Mais uma farsa
De peito aberto.

Um homem de gravata contra os homens de amor.

Quando vi,
nos dois primeiros minutos
de um dia acinzentado,
um homem de gravata
me dizendo:
- Privatize-se!
- Desocupe os teus sentimentos!
Foi com um nó na garganta que pensei:
- Que tipo de sugestão é essa?
- Não há, como se fazer tal coisa, há?!
-Jamais poderia,
jamais poderíamos!
não se perde a única coisa
que se tem.
Mesmo que massacrada
só há vida humana,
onde há subjetividade,
só há vida humana
onde há amor.
E não existe outra forma,
o amor é objetivo.
Se propaga, consequente,
e quer colocar flores nas gravatas,
e salvar da barbárie,
a flor dos homens.
Nem que seja com sangue,
nem que seja de lágrima,
há de se promover o resgate,
da humanidade.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Digestão

Arrancou-me as vísceras
e deixou-as totalmente expostas
deixou escorrer o meu sangue
nas ladeiras tortuosas
misturando-se à cerveja
nas libidinosas noites.

Tombado feito espantalho
cabeça ao peito
braços em haste
fui crucificado.

Da ultima chaga
só lágrimas,
lágrimas doces,
por ter amado,
néscio.

Comi as pedras
digeri o desengano
suguei o veneno
dos veios, das covas.

chamei de meus
todos os planos,
de ser nobre
de ser vil
de suceder
de fracassar
de amar
de perdoar.

E aprendi:o contrário do amor é o perdão!
e todos os homens, sem seus contrários,
não são mais que vacuidades.
tudo que se é, constitui-se na alteridade
e pra alteridade o necessário
é enxergar teu rosto, no espelho do passado.

Criação

Quando me perguntam:
Crês na criação?
Respondo logo que sim.
E como poderia crer que não?

Com tantas indústrias,
fumaça que entope os pulmões,
jagunços corporativos
chicotes modernizados.
Maçãs pecaminosas,
cruzes virtuais.

O homem cria a fundo!
é espetacular o que fez
do mundo, sua imagem
e dessemelhança.
Trabalho mais criativo?
Impossível!

Pois é fácil, ver Deus,
todo dia às sete
tomando aquele café
corrido, torcendo,
pelo atraso do bonde
e pela chegada da regra.

Porque filho é só
parecença, e ninguém quer
igualdade.

Quer mesmo ser
criador da criatividade.
Toda a obra,
é apenas,
metade.

Mas o capital,
é quem sabe se pôr
e cria duas vezes
dez mil Deuses,
e não tem tempo
pro sol se opôr,
a não ser que seja:
no fundo da tela
de um computador.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Revisar cada fato
compreender o irrepreensível
num homem qualquer
a falta de tato
diante de um mundo
incognoscível.

tomar emprestados sentimentos
somente os mais fortes,
em ode ao ódio, terror,
repúdio à sorte
somados ao amor e coragem da vida.

e viver num compasso
de chegadas e partidas
humanizando-se em cada passo

e ver de perto que é na hora da saída
que todas as portas se abrem com agrado
sabendo-se tecido em linhas tortas.
e escrevendo-se
mesmo desconhecido do que é.
As dores excruciantes
de perto são gigantes
e de longe não se vê

os homens desimportantes]
ratos de todos os instantes
fazem a humanidade se mover

beijos agonizantes
sob as dores dos amantes
são, a fundo, sem porquê

ao fim desses caminhos
todos os tragos sorvidos
ficam amargos de beber.
Desejei uma miríade de mulheres
pra juntarem-se ao meu corpo
tomei todas as drogas
pra elevar meu espírito
escrevi com todas as letras:
'não compactuo com isso!'
E não restaram,
nem um, nem outro
me tornei um porco de espírito.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Vai pesar o dia em que me abater, doentio,
Mas tendo você ao meu lado, não se abrirá a ferida,
Não será nada além do frio.
Velhor e cansado, não vai adiantar o ser ou estar,
Só restará o ter sido – tecido retorcido –
Mas não desaprenderei a amar, e vou
Reconhecer o teu cheiro, embebido,
Nas colônias de um amor senil,
Embevecido nesse cheiro, permanecerei.

Vou adorar o momento em que, no ocaso da vida,
Quando sentares ao meu lado e disseres, ao moribundo:
Vistes valeu a pena cada segundo,
Tua morte se justifica e ainda há amor no mundo
Com o peso das tuas chagas, com o sangue das feridas.
Não lamentarei, não me ocuparei de refletir, mas
Saberei no exato instante, que realmente,
Fui feliz...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Pra ela

Todas as noites encontro uma mulher
Os cabelos em caracóis e cachos
Nem sempre bem ordenados
Como a me dizer: toque me!
Fui feito pra ser amado!
Por vezes, me aproximo,
Por outras, me afasto,
O fato é que tal mulher,
Deixou meu peito em descompasso.
Arrancou todos os tijolos do meu muro
E deixou profundas as unhas na minha carne.
E para além do destempero,
Só há um objetivo em mim inteiro,
Até a morte poder vê-la
Seja em sonho, seja ao vivo
Seja torto ou seja firme
Que ela me ame ou não.
Gostaria ao menos de que,
uma vez por dia,
pudesse sentir seu cheiro
ou segurar sua mão.
Não é a libido ou lassidão,
É a verdade de alguém,
Que só quis fazer uma vez,
Ato nobre que é doar seu coração.