segunda-feira, 14 de maio de 2012

Cidades I

Essa compulsão, megalomania Pela totalidade. Eterna todo o dia. Já deu ferida funda às cidades Da agonia. Voam céus sobre cabeças Que traspassam avenidas Correntezas, dia-a-dia, multidões de formigas. Os céus notam? Claro que não! Não tem tempo pros disparates Dessa gente sem poesia.

Oração a Baco

Deus da ebriedade, Baco, adorado Toque sua música, sensual, cativante Enquanto caminhamos, passos largos, Ao abismo, encantado, da saciedade. Toque sua flauta demoníaca, Que seduz a mais formosa Das Helenas recatadas. Na noite que reina voluptuosa, Dê-nos seu vinho mais forte Pra produzir efeito amargo, Deixar-nos num estado De felicidade desdenhosa. Coloque à mesa um banquete! Qual festim do pecado primeiro, Engana-nos por inteiro e faz morrer a saudade, o desterro.
A poesia é um jeito estúpido De profetizar, versificando, Aquilo que nunca será. A poesia é um modo pardo, De enxergar o mundo em cores, E deixar de lado as amarguras. A poesia é um calmante, Para viver, cada ínfimo instante, Padecendo superlatividades. O poeta, idiota, com sua prosa rôta, Arrota em cada letra, uma lágrima, absorta. O poeta, dilatado, de seu modo torto e alçado, Racionaliza as derrotas em soluços malfadados. O poeta, desmembrado, sensual, imaculado, Faz da vida, qualquer coisa, uma canção agoniada. O leitor, falso esteta, é comedido por um espasmo. E na vontade de ser sábio, comete o crime do entusiasmo. O amor, belo diabo, com seu aspecto, abestalhado Comove o mundo, através das flores, ao do pé do túmulo Do poeta feio, dos versos faustos. Onde a lápide diz: Não foi ninguém o tal coitado! Mas, se caso a vida, que lhe faltou, Tivesse, em tudo, perdurado O homem triste, de versos fúnebres, Teria um dia, quem sabe, se tornado Um ninguém para eternidade. Um homem digno, de ser guardado.

Aedo

Somos poetas mortos. Sepultados num perfume de lótus, Derrotados pela morfina dos tempos. Sinais da derrocada, nossa sina. A lua nega sua face clara e fria, Abandona a poesia à sua sorte Não se importa com o imperfeito. Só quer alguém que aposte. O sol fechou seu branco pranto. Em nuvens esparsas, negro manto, Desdenha tudo, e, por agora, Se faz de cinza pra ficar mudo. Da terra? Nenhum fruto, Nem flor possui encanto. Seus odores, finados santos, Privados dos belos sonhos. A humanidade, diabo brando, Essa, sim! Vive sobre destroços. Das canções nunca entoadas, Pelos profetas dos escombros. Morre aqui um degenerado! Mais uma aedo em desgraça, Há de encontrar, um dia, ao lado, Um verso nulo, engatilhado.

Comunhão

Já temos os nossos destinos! Conseguimos os nossos deuses, Superamos heróis meninos, Em um milhão de vezes. Confessamos as mentiras, que disseram ser a vida. Pois dela, a qualidade, É não poder ser, jamais, Mentida. -//- Nos estábulos, Onde a razão defeca, Suas idéias, martírio não são, Sob as patas de um burro asceta. O que é razoável? É, então, comer a relva Pastar cada erva, cada grão E esperar pela morte certa. Hoje em cima, amanhã não. O chão é o que nos espera. Já não há mais comunhão; para além dos vermes, para além das merdas.

Dois

Duas constelações, Estrelas de pontas finíssimas, Que indicam uma morte, Onde tudo é próximo da vida. Duas armas quentes, Apontadas para um só peito, Lágrimas derramam-se dos olhos Aqui se atira por respeito. Dois tapas sem ruído Numa face que murmura Contra a mão calejada Ofensas e amarguras. Em dois bancos separados Mata-se em delírio. O nobre amor desatado, De quem nunca foi amigo. Dois assassinos, sem mais. Não é vão o sangue púrpura Que ainda jorra na calçada, Sob o sorriso de estrelas cruas.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Regressivamente

5 (cinco) comprimidos
Pra passar o medo
4 (quatro) maços de cigarro
pra matar a ansiedade
3 (três) doses de conhaque
Pra adoçar o desespero
2 (duas) carreiras de pó
Pra criar alguma coragem
1 (um) grande baseado
Pra ver que estamos de passagem.

1 (uma) vida estilhaçada
com as sobras de humanidade
2 (dois) anos miseráveis
adormecido sem estar deitado
3 (três) amores dispensados
pois não há qualquer vontade
4 (quatro) cortes bem profundos
pra sentir a nudez e crueldade
5 (cinco) lágrimas minguadas
antes do fim da realidade.

Anda, Vai!

Chupa!
Anda, chupa!
Porque a vida
É seiva bruta
E não permite
Renúncias.

Lambe,
com vontade
pois a vida
é só uma
e o prazer
é a verdade.

Vai,
bem animada
e faça da carne
maculada,
seu infame
desejo.

E depois,
do conclusivo beijo
queime, no desdém
dos olhos
que te possuem,
do homem que
vira as costas,
No primeiro ensejo.
A razão de toda a bebedeira
É a facilidade com que se vislumbra
Idéias assaz altaneiras
Com as quais se planeja
Toda a vida, numa sexta-feira.

A razão de todo porre
É poder morrer quando se escolhe.
E viver pequenas aventuras,
Quando o copo te engole.
Saber furtar-se de todo o juízo
Sabendo-se ninguém.

É anular o que o ego quer,
E dizer com as pulsões
O que se sabe errado.
É aliviar a carga, como(?)
Se o mundo estivesse encharcado.

A razão de qualquer bebedeira
é a paixão por qualquer perda
é função de qualquer merda
numa vida sem sombra e esteira.

Auto (Retrato)

Um homem de estatura mediana.
Nem gordo, nem magro
Pele morena, acinzentada,
Com olhos agudos, de bom traço.
Barba mal feita, desleixada.
De gestos bruscos, mas fino trato,
Pensamentos altos e baixos atos.
Foi feito mínimo por seus fortes laços.

Nasceu nas montanhas,
No mês de março.
E vive nas entranhas,
De um eterno cansaço.

Conhecedor das mulheres,
mas, somente por retratos
Se vicia mansamente,
Obedecendo a um compasso.

Onde a cachaça arde
E a fome cede espaço.
Em uma embriaguez diária,
Vão se apagando os fatos.

Sonhou a vida,
Em meio a um mar de abraços.
Mas acordado,
Percebe que acabaram suas chances.
Vai! Sozinho!
A dar seus passos...

O diabo e eu

Fiz uma casa no inferno
toda revestida de sonhos
com a puerilidade, juvenil,
descontínuas paredes nuas,
tristeza, um amor medonho.

Mas, não, não foi o Diabo,
quem fez ruir a casa do homem
foram, uma após outra pedra
atiradas nos peitos arfantes.
Outros homens mataram os sonhos.

Não foi o Diabo, o sádico
que fez sátira da minha pobreza,
que se riu de minha maior tristeza,
com sua sinistra arcada dentária.
Mostrando-se saciado com o fracasso.

Ele, demoníaco, pitoresco, belo!
Me ofereceu um chá bem singelo,
e disse que, agora, era digno
da sua companhia, e que,
mesmo tendo em mim, a maior
dentre todas as alegrias,
já não poderia voltar atrás.
Pois havia entendido que o mal,
tão adorado e tão temido,
não é o diabo quem faz.

Mas o homem que ao se ver
refletido no amigo, transforma-se
de imediato, em besta voraz.
E arrasa tudo que havia construído,
dando ao conhecimento, a fama por trás.

Deixei ele pra lá, e dei ouvidos,
mais uma vez, às tentativas
que o meu amor me traz,
pois, ele me entende, e sabe bem,
que a minha tolice extrema
é por querer ver no homem,
um ser que destrói, por amar demais.

Um dia, hei de tomar outro chá,
e entabular nova conversação,
quero explicar-lhe, que entendo
o sofrimento que lhe aflige
e que seu amor também não foi em vão.

O Anjo da Luz, do conhecimento,
da razão, gosta do homem,
como gosta um irmão.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Tudo em nós é nojo,
não nos escondemos
em sonhos vãos
e sabemos exatamente
que nada temos
nas palmas das mãos.

Tudo em nossa vida
é despojo inútil
das certezas que
estilhaçamos no chão,
quando quebramos
o encanto fútil,
dos oníricos dizeres
de amor.

Não há o que se dizer
quando fechamos os olhos
e não há mais pensamentos
sãos e nem vontade de
seguir juntos.

Só resta a dor
e os rasgos fundos
que minha carne conserva
como prova indefectível do amor,
agora, mudo.